terça-feira, 1 de abril de 2014

A Oração e a Providência - II


A oração coopera com o governo divino
Pe. Garrigou-Lagrange, O.P., 
La Providence et la Confiance en Dieu

A oração não se opõe as disposições providenciais, como se tratasse de torcê-las ou de mudá-las, antes, colabora com o governo divino; porque o que ora, quer no tempo o que Deus quer ab aeterno.

Poderia parecer que, quando oramos, a vontade divina se inclina para a nossa; a verdade é que nossa vontade se eleva até a divina e trata de colocar-se em uníssono com ela. Porque em elevar a mente a Deus, como dizem os Santos Padres, consiste a oração, por vezes de petição, outras de adoração, também de louvor, reparação ou ação de graças.

O que ora como convém, ou seja, com humildade, confiança e perseverança, pedindo os bens necessários para a salvação, colabora com o governo divino. São dois, em lugar de um, que querem a mesma coisa. Esse pecador por quem temos largamente orado, Deus é quem o converte. Essa alma atribulada, para quem temos pedido com insistência luz e fortaleza, Deus é quem a ilumina e fortalece; porém Deus tinha resolvido desde toda a eternidade não produzir o efeito salutável senão com o nosso concurso, depois de nossa intercessão.

As consequências deste princípio são inumeráveis.

Segue-se primeiro que quanto mais conforme seja a oração com as intenções de Deus, tanto mais colabora com o governo divino.  Para que cada vez mais nossa oração seja conforme à vontade divina, rezemos todos os dias, em silêncio e no íntimo da alma, o Pai Nosso, e meditemo-lo acompanhando nossa fé com o amor. Esta meditação amante se tornará contemplativa; por ela obteremos que o nome de Deus seja santificado, glorificado em nós e ao nosso redor, que seu reino venha, que sua vontade se cumpra na terra como se cumpre no Céu; obteremos também o perdão de nossas faltas, a liberação do mal, a santificação e a vida eterna.

Segue-se também que nossa oração ganhará em pureza e eficácia se a fazemos em nome de Cristo, o qual saberá suprir a deficiência de nosso amor e de nossa adoração.

O cristão que cada dia reza melhor o Pai Nosso, e o diz do fundo de sua alma por si mesmo e pelo próximo, coopera grandemente com o governo divino. Coopera muito mais que os sábios que descobriram as leis do curso dos astros, mais que os grandes médicos que encontraram remédios de espantosas enfermidades. A influência da oração de um São Francisco de Assis, de um Santo Domingos, de Santa Teresinha do Menino Jesus, não é certamente inferior a de um Newton ou Pasteur. Quem ora como oraram os Santos, coopera com a salvação dos corpos e das almas; cada um que abre as janelas de suas faculdades superiores para o infinito, é como um universo que gravita em torno de Deus.

Se atentamente consideramos estas íntimas relações da oração com a Providência, concluiremos que àquela é mais poderosa que o ouro, mais eficaz que a ciência. A ciência chega a resultados maravilhosos, porém se adquire por meios humanos e produz efeitos que não excedem os limites naturais. Porém a oração é uma força sobrenatural, cuja eficácia vem de Deus, dos méritos infinitos de Cristo, da graça atual que nos move a orar; é uma força espiritual mais poderosa que todas as forças naturais juntas. Ela consegue o que somente Deus pode conceder: a graça da contrição, da caridade perfeita e da vida eterna, que é o fim do governo divino, a manifestação última da sua bondade.

Consideremos com particular interesse a necessidade e a excelência da oração; sobretudo da oração unida à de Nosso Senhor Jesus Cristo e da Bem-aventurada Virgem Maria, nestes críticos momentos em que tantos perigos pairam sobre a Europa1;  neste momento em que a desordem geral deve, pelo contrário, servir-nos de estimulante para pensar todos os dias que estamos não somente sob o governo dos homens, continuamente desatinado e imprudente, senão sob o governo infinitamente sábio de Deus, que não permite o mal senão com olhar para um bem superior, e quer que cooperemos para esse bem por meio da oração cada dia mais sincera, profunda, mais humilde e confiante, mais perseverante, por meio da oração unida à ação, afim de que cada dia se realize em nós e ao nosso redor a petição do Pai Nosso: Fiat voluntas Tua, sicut in coelo et in terra. Nestes momentos, quando o comunismo realiza tantos esforços contra Deus, convém repeti-lo com redobrada sinceridade, não somente por palavra senão por meio de atos, afim de que o reino de Deus substitua cada dia mais o reino da concupiscência e do orgulho. Assim chegaremos a compreender de maneira prática e concreta que Deus não permite os males presentes senão com olhares bem superiores, que conseguiremos ver, se não aqui em baixo, ao menos depois da morte.


 1-        A edição francesa foi impressa no ano de 1932.

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