sexta-feira, 23 de março de 2012

As fontes das dores de Maria




Após a consideração das dores  de que foi repleta a vida da Rainha dos mártires, e fizeram da Sua existência um martírio prolongado, e de cada um dos Seus dias uma etapa para o Calvário, detenhamo-nos nos pormenores dos Seus sofrimentos.

De fato, em parte alguma o amor cintila tão puro, tão desinteressado e tão atraente, como através das lágrimas e das dores.

Aliás, a Virgem não sofre senão por amor. O Seu corpo virginal não está crucificado, mas, ao contrário, que gládio trespassou a Sua alma! gládio de duplo gume, afiado incessantemente pelo Seu amor a Jesus e o Seu amor aos homens.

Antes de tudo, quais eram as fontes principais destas dores?... Quatro principalmente:

A primeira, era ver Jesus morrer, e não poder morrer com Ele. Não há uma só mãe que, em semelhança circunstâncias, não tivesse desejado vivamente a morte. Para um coração triturado, a morte é preferível à vida. E, se a morte se apresenta, não como uma separação, mas como uma união realizada mais íntima, que mãe aflita a não consideraria uma inexprimível favor?...

Tal se dá com Maria. Jamais um filho foi, aqui na terra, tão querido de sua mãe, como Jesus de Maria; jamais um filho foi tão bom e tão belo, tão amável e tão verdadeiramente "filho" como Jesus.

Os direitos do pai e da mãe concentravam-se, ao mesmo tempo, no coração da Virgem. Ela só O havia gerado, e isto sobrenaturalmente, de tal modo que Jesus era como duas vezes Seu Filho. E este Seu Filho estava revestido, ao mesmo tempo, de todos os atrativos da humanidade e de todos os encantos da divindade.

Que amor veemente, digamos melhor, que paixão divina não devia excitar, no coração de Maria, a contemplação das amabilidades infinitas de Jesus!

E este Filho, tão divinamente amado, partia desta vida, partia, deixando a Sua Mãe só, desolada, com o coração transbordando do mais veemente desejo de segui-lO, e com a Sua alma cheia de dolorosas lembranças do Calvário.

Jesus ia-se embora... Desde então Ele não estaria mais com Ela, para falar-Lhe do céu... E Ela estaria separada dEle.

Mas, então, por que vivia Ela ainda?...

Sua união com Ele era habitual e tão estreita que Ela Se tornara a Sua vida; e agora, na hora suprema, esta união ia ser rompida, quando Ela desejava o mais vivamente possível assemelhar-Se a Ele!

Como, pois, era prodigioso o amor de Maria, para obedecer assim à vontade de Seu Filho no Calvário, vontade esta que Lhe prescrevia a separação e a obrigava a prolongar a Sua vida durante vinte e quatro anos de um incompreensível martírio! (Dizemos 24 anos, na opinião de que Maria viveu até 72 anos; mas uma outra diz 63 anos)

A segunda causa da aflição para Maria foi o ser Ela testemunha ocular da Paixão, sem poder aliviar os sofrimentos do Seu divino Filho. As revelações dos santos nos ensinam que a Santíssima Virgem, embora corporalmente ausente do Getsêmani, assistia em espírito e seguia interiormente às diversas fases da agonia do Salvador.

Mas Ela estava corporalmente presente no caminho do Calvário, e na crucifixão; Ela O seguia e assistia (com que dor!) a cada nova tortura que a impiedade judaica inventava para aumentar os sofrimentos do Seu Filho. Ela assistia a tudo, via tudo e Se desolava por não poder proporcionar o menor alivio a Jesus.

Os espinhos faziam o sangue correr lenta e penosamente, sobre os olhos do Salvador, e Maria não podia Se aproximar para enxugá-lO.

Os lábios de Jesus estavam ressequidos e descorados pela sede, e a Mãe desolada nem sequer podia ir depor neles [um refrigério].

Esta cabeça dolorida, admirável aos olhos dos anjos e tão divinamente radiante de dor e de amor, desaparecia sob o pó, o suor e o sangue... e a Virgem nem mesmo podia, como a Verônica, enxugá-la com o Seu véu, e lavá-la com as Suas lágrimas.

Depois, Ela vê o Seu Filho suspenso no patíbulo dos malfeitores, com as mãos e os pés trespassados, e com o corpo sangüinolento e lívido. A cabeça do divino paciente cai para trás, os espinhos penetram mais fundo, e, inclinando-Se para a frente, todo o corpo fica suspenso dos pregos, que Lhe dilaceram mais as Suas mãos delicadas.

Oxalá pudesse Ela sustentá-lO nas Suas mãos maternais e deixá-lO repousar nelas até à hora suprema, em que Ele deve morrer!

Mas, não! Esta última consolação não Lhe será dada, senão depois que Ele tiver expirado.

Uma terceira fonte das dores de Maria é a visão distinta que Ela tem do pecado, e a apreciação que Lhe inspiram as cenas sangrentas da Paixão e do Calvário.

Com efeito, não podemos duvidar de que Nosso Senhor tenha permitido que Ela participasse, em certa medida, do Seu conhecimento sobrenatural da extensão do pecado, da sua excessiva malícia e do ódio que ele excita em Deus, conhecimento este que distinguiu Jesus e deu aos sofrimentos da Sua Paixão o seu verdadeiro caráter.

Foi a visão do pecado que crucificou a alma de Jesus no Jardim das Oliveiras; foi à visão da cólera do Seu Pai contra o pecado, que Ele pediu com tanta tristeza que Se Lhe afastasse esta cálice.

Lemos que Santa Catarina de Gênova caiu desfalecida, um dia, quando Deus lhe mostrou, em uma visão, que horror é preciso ter a um só pecado, mesmo venial.

Em Maria não podia haver este desfalecimento, pois os dons que Lhe havia outorgado o Seu divino Filho ultrapassavam os dos santos, o mais que poderíamos dizer; por conseguinte, o Seu horror ao pecado sobrepujava a todas as nossas concepções. Deste modo, apareceu aos Seus olhos, sobre os ombros chagados do Seu Filho, a visão hedionda e repelente dos pecados do mundo inteiro.

Ela via como era verdadeiramente a Deus que o pecado atingia, ofendia e cobria de opróbrios. O terror que deles sentia o Salvador fazia-Lhe sofrer mil mortes interiores.

Faltam-nos palavras para pintar um tal suplício. Enfim, a estas fontes tão cruéis de sofrimentos acrescenta-se a perda prevista de tantas almas, para as quais o sangue divino ia ser inutilmente derramado. É a quarta fonte.

Pensemos no valor de cada gota deste sangue divino. Ele foi derramado para cada alma em particular; e, entretanto, quantas almas perdidas para a eternidade! Eis o preço que Cristo pagou para o resgate das almas; e, entretanto, Ele vê desaparecer o Seu valor.

Se uma só alma, para a qual toda esta Paixão foi sofrida de propósito, tivesse que perecer para toda a eternidade, tornando inútil, pelas suas ofensas, o amor do seu Salvador, que angústia imensa era a Sua dor, pois que não era só uma alma, um número incalculável delas que haviam de perder-se!...

Ah! Jesus sofria, sobre a Cruz, uma outra crucifixão invisível, e muito mais angustiosa do que aquela que aparecia aos algozes e aos espectadores; era a crucifixão de um coração saciado de sofrimento ao pensar na multidão inumerável dos que se separariam dEle, que deixariam de ser Seus membros e que se perderiam irrevogavelmente.

Também neste cálice Maria teve o Seu importante quinhão. E se, neste momento, Ela discerniu o que este pensamento Lhe fazia sofrer por causa do Seu imenso amor a Jesus, e por via de conseqüência, por causa do Seu imenso amor às almas, Ela viu então dois abismos separados e hediondos, nos quais Ela devia entrar voluntariamente, apesar do horror que deles A afastava.

E nesta multidão de pecados, cujo peso torturava a alma virginal de Maria, estavam os nossos próprios pecados. A Virgem os distinguiu, e o Seu olhar cheio de lágrimas elevou-se ao céu, para implorar-nos o perdão e a misericórdia.

Quando, enfim, amaremos nós aquela que nos amou tanto, e que, para provar-nos o Seu amor, submeteu-Se a angustiosas torturas e a suplícios intensos!

Digamos-Lhe, portanto, com a Igreja: "Ó Mãe, ó fonte de amor, fazei que eu sinta a Vossa dor, e que eu chore conVosco".

"Eia Mater, fons amoris,
Me sentire vim doloris
Fac ut tecum lugeam!"

(Por que amo Maria, pelo Pe. Júlio Maria, continua com o post: Caracteres das dores de Maria)
 

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